26/11/2008

dito de costas para ti


now_i_see by Frank Grisdale



viro-me e oiço o vento

não sei nada de mim para além disto - viro costas ao vento!

e é nesse acto que me reinvento para re-existir

eu que morri para tantos. que lhes perdi a conta. ou o conto?

conto não de fadas. de demónios

quem os irá salvar?

encrontrarão sinónimos de si para iludir anónimos ouvintes

sim. sempre haverá


a sorte não nasce com a justiça

fabrica-se pela astúcia de uma mentira lúcida

até parecer___________verdade


24/11/2008

estação



vesti-me a rigor para a entrada mágica

do Outono

queria a languidez da morte. prevista ansiada

que todos os anos antecede o gosto

de se renascer

vesti-me a rigor com as cores quentes

feitas de folhas quase a decompor

de frutos deixados no lugar de flores



depois flutuei na beira do rio

folha-eu caída de dentro de mim

sem temores de morte. é isso o outono. a renovação


a chuva não veio. o rio não encheu

serão as estações que estão a mudar?

ou nesta estação que tanto anseei. para a qual me vesti de folhas e frutos

termino eu?





images by Al Magnus

17/11/2008

os Mestres

image by Al Magnus


na infância perdida encontram-se os poetas e os santos


os poetas voam na arte de sonhar alto

num mundo onde se morre de morno desespero

os santos querem ser deuses e sabem que não podem lá chegar

então conformam-se em ser bons ou mártires


e assim, como num jogo e a brincar, nascem os grandes mestres

de sofrer.

13/11/2008

onda de rio

wave of river
foto de madalena pestana



dia de nuvens brancas. um rio que se escurece. maré cheia a ondular a água como se vento houvesse.

arredei-me do meio líquido um tempo atrás. sensibiliza demais a fragilidade dos meus nervos

faz-me crer numa paz que não existe. relembra ou cria amores. ondeia. embala a vida

tal qual um barco de madeira leve. só feito para brincar na margem. por crianças.

não posso dar-me ao luxo de brincar. não. porque dói nos joelhos-da-alma cada queda

mas o apelo da água é mais forte. aproximo-me quase até me molhar. cada salpico toca no meu sangue

subitamente soa uma harpa antiga no meu cérebro. cânticos tão esquecidos quanto vivos entoam em redor

e entro enfim na onda a aquecer-me do frio.


com medo ou não de amar eu volto ao rio

10/11/2008

terra toda

Storm-Oil On Canvas By Nicoleta Bida


a tempestade há. tem aroma tem cor. vibrações invisíveis

ondulações violentas de ar. azuis-negro no queixume das aves

que se afastam da costa ou da montanha. que se afastam porque

têm outras penas a poupar. sem ter de voar as penas da tempestade

que sentem longe. longe ainda. no odor. porque também vem no vento

o aroma a lágrimas sem sal. pairando. acumulando-se antes de desabarem

em aguaceiro convulsivo. como o choro gigante de um deus muito distante


distante e a aves sabem-no. nós é que não. nós é que esquecemos

que toda a natureza é a mesma matéria cuspida pela mesma boca

no dia da grande explosão. da grande fúria quente desse deus



e se houver uma inspiração. fria. longa. imensa. devorante

que nos sugue para o centro de um infinito bocejo. ao contrário

e deus virar as costas à terra toda. por cansaço de nós?

09/11/2008

05/11/2008

até Já.


“Pretends to Be Free” by Caroline Torres


do processo de estatificação

by Blancoperfecto

era tão óbvio que o tempo viria.

o tempo de ser estátua que ninguém quer no meio da praça mas alguém lá colocou em dia menos inspirado.

sentia-se nos gestos. na ausência de ouvir. no facto de ignorar. afinal quem fala com uma estátua a não ser um doido ou um bêbado à noite?

sentia-se. eu sentia. só me faltava a hora. mas ela vem aí, com uma espécie de aviso prévio.

(primeiro quase ceguei. depois parti um dedo - corrijo, parti um dedo porque quase ceguei e não consegui tratá-lo a tempo de não ter de o operar para o curar - . não o curei. dói. me. com o frio que veio de repente. isto é humano. isto é viver de gente. )

mas. uma estátua de dedo partido é ainda mais inestética no meio das plantas novas do jardim..

primeiro há que arranjar lugar para a arrumar. depois... bem depois de encontrada a prateleira aonde não se veja, para que não se sinta nem se oiça (mas ouvir uma estátua? lá está a minha cabeça a fugir para a loucura. Deus me ajude!). há que referir o dedo deformado e a ausência no jardim de uma imprescindível redecoração. afinal é tão necessária uma estátua novinha em folha para substituir aquela!

e assim segue o caminho, um pouco mais lento, de saber como se atira para a reciclagem uma estátua.

convém que não pareça lixo, ainda que o seja. convém um bom pretexto, não que seja preciso, mas parece bem... quem sabe serve o nome maldito ou não de quem lhe deu para a esculpir?

há sempre uma maneira. que neste mundo admirável, sempre bastou querer para conseguir.

quando eu contar o fim verão se a previsão era falta de senso ou... senso a mais e atempado.

em todas as coisas é só ler os sinais e a mudança deles e ... qualquer um é adivinho.

podem acreditar.

03/11/2008

o vestido

James Martin Oliver Wardell



as palavras insistem em não me abandonar.

perseguem-me como a terra segue o sol mas sem carência disso

por pura crueldade.


deito-me rio e acordo no Mar

mergulho e ergo-me ao lavar-me delas.

pois se as não sei usar para que me seguem e se colam à pele como um vestido velho?



se ao menos fossem estrelas...

02/11/2008

pausa breve na Pausa

imagem at mg.scoop.co.nz



para mim o Amor morreu há muitos anos já. ainda falo dele como se o vivesse

ou fui eu que morri e me recuso. por teimosia. a acreditar na morte (minha para o Amor)?